QUEDAS

Quando a nuvem desaba

Por que o futuro da TI depende da descentralização?

27 de outubro de 2025 - 08:36
Vicente Neto, co-Founder e CEO da EVEO (Foto: LinkedIn)

Vicente Neto, co-Founder e CEO da EVEO (Foto: LinkedIn)

Quando um data center na Virgínia trava e paralisa operações na Europa, no Brasil e no Oriente Médio, o alerta é claro: a infraestrutura digital mundial está concentrada demais para ser estável. Em algum momento, a tecnologia confundiu comodidade com estratégia. Centralizou demais. Automatizou demais. E esqueceu que quem perde o controle da própria base perde também a liberdade de operar.

Nos últimos anos, a dependência de grandes provedores de nuvem atingiu um ponto crítico. A cada nova falha de um hyperscaler, cadeias inteiras de negócios são interrompidas, dados se tornam inacessíveis e milhões de usuários ficam no escuro. Criamos uma internet concentrada em poucos provedores globais, com dependências invisíveis. De fato, segundo pesquisa da Gartner (2023), o risco de “concentração na nuvem” está entre os top 5 riscos emergentes para organizações, com 62% dos executivos de risco apontando essa dependência excessiva como uma preocupação crítica.

A promessa da “elasticidade infinita” da cloud se tornou uma fragilidade disfarçada. Alta disponibilidade dentro do mesmo ecossistema não significa resiliência, é apenas uma redundância ilusória. Quando a base cai, cai tudo junto. E, no cenário atual, o risco é sistêmico: uma falha em um único ponto pode ter impacto global. Um levantamento do Uptime Institute mostra que mais de 67% dos incidentes públicos de interrupção em data centers envolvem provedores comerciais terceirizados, sinal claro de que a dependência está no centro do problema. 

Enquanto isso, seguimos repetindo mantras como “99,9% de uptime”, “failover automático” e “escala global”. Mas o que adianta uptime se o core do seu negócio depende de uma única rota, de uma única API, de uma única decisão que você não controla?

O incidente mais recente da AWS é apenas um sintoma de um problema estrutural. A infraestrutura global de TI se tornou concentrada a ponto de perder a própria essência: ser distribuída. Diversificação na computação em nuvem não significa migrar de um gigante para outro. Significa repensar o modelo. É combinar diferentes tipos de infraestrutura, como nuvens privadas, edge computing e provedores locais, para garantir que nenhuma falha isolada comprometa o todo. É distribuir de forma inteligente, levando workloads para onde faz mais sentido: perto dos usuários, em regiões diferentes, com controle sobre dados, custos e soberania.

Infraestruturas críticas não falham por falta de tecnologia. Elas falham por excesso de dependência. A estabilidade vem de uma arquitetura consciente, personalizada, desenhada para resistir, não apenas para funcionar. E isso exige uma nova mentalidade: menos centralização, mais autonomia; menos promessa de escala, mais propósito de controle.

*Por Vicente Neto, co-Founder e CEO da EVEO, empresa brasileira de tecnologia especializada em soluções de nuvem, servidores dedicados e data centers com mais de 25 anos de experiência em serviços de internet.